Pesquisas no Arquivo Nacional – Registro de estrangeiro

Umas das grandes fontes para pesquisa de estrangeiros no Brasil no século XX são os registros nacionais de estrangeiro (RNE).

Em 3 de outubro de 1930, Osvaldo Aranha e Flores da Cunha, que poucos anos haviam se enfrentado na fraticida Revolução de 1923, atacam o quartel da 3° Região Militar em Porto Alegre, dando início à Revolução de 1930 – o que levaria ao poder Getúlio Vargas e toda uma reorganização do estado brasileiro.

O QUE SÃO OS RNE?

Parte da reorganização seria da relação do Brasil com estrangeiros: através do decreto-lei 406, que regulou ainda mais a entrada de estrangeiros no Brasil. Esse decreto-lei também previa que estrangeiros se registrassem nos institutos de identificação. Em 20 de agosto do mesmo ano, o decreto-lei 3.010 regulou ainda mais a questão. Todo estrangeiro com mais de 18 e 60 anos de idade, independente da data de imigração, deveria se registrar na delegacia de polícia mais próxima do local de residência.

Portanto, imigrantes nascidos antes de 1878, não eram obrigados a se registrarem, mas ocasionalmente o faziam. Estrangeiros falecidos antes de 1938, naturalmente, não fizeram esse registro – e não adianta procurar pelo RNE.

O RNE não era apenas um documento, mas um conjunto documental do qual a parte mais interessante para pesquisa genealógica é o prontuário de estrangeiro. No prontuário, o imigrante tinha que responder um questionário a anexar provar disso, caso tivesse. As perguntas variavam com o tempo, mas na década de 1930 e 40 eram nome, naturalidade, filiação, estado civil, filiação, profissão, local de residência, data, navio e porto de chegada no Brasil e se havia se ausentado do país após a chegada.

Outras partes eram o livro da delegacia, a ficha remissiva, a carteira de identidade e a certidão de registro.

O QUE CONSTA NUM PRONTUÁRIO DE ESTRANGEIRO?

Os documentos apresentados variaram. Seguem alguns exemplos de prontuário de estrangeiro:

O primeiro prontuário é de meu bisavô Konstantin Semionovich Boiko (1911-1968), natural de Trubowszczyzna, vila do município belarusso de Kozłowszczyzna. Nele, não foi anexado nenhum documento, apenas respondido o questionário. Importante notar que ele disse ser natural da Polônia – visto que na época, aquela região era parte da Polônia.

O segundo prontuário é da imigrante galega Elvira Perez Piriañiz, filha do médico Manuel Pérez Herbella (natural de A Vilavela, na província espanhola de Ourense) e Juana Piriañiz Arellano (natural de Tudela, província de Navarra). Ela anexou declarações de pessoas conhecidas.

O terceiro prontuário é Symon Haydysh, imigrante de Zabotlone, em Kryzhopil, na Ucrânia. Neste, foi anexada a certidão de nascimento de um filho – e há uma foto do imigrante! Os prontuários são uma das fontes que podem ser utilizadas para procurar fotos de imigrantes.

O quarto é o prontuário de Antonina Golczynka, imigrante criméia que viveu em Curitiba. Este prontuário é bem mais moderno – de 1957 – e bem mais completo. Além de fotos, há digitais, tradução de passaporte e até uma carteira de vacinação!

O quinto é o prontuário de Badiha Abraão, imigrante síria. De mais interessante, há uma certidão de casamento e uma cópia da carteira de identidade de estrangeiro – como foto da imigrante.

No sexto prontuário, do libanês Salomão Iared, há um documento raríssimo: um diploma relativo à participação do imigrante na maçonaria!

O conteúdo dos prontuários, como pode ser percebido, variava muito – também sendo possível ter documentos de origem estrangeira, certidões de casamentos, habilitações de casamento, certidões de propriedade de imóveis, declarações de próprio punho e vários outros tipos de documentos.

COMO PESQUISAR RNE DO SUL E SUDESTE

Primeiramente, as instruções a seguir só valem para quem se registrou como estrangeiro nas regiões Sul e Sudeste.

Algumas informações são necessárias para pesquisa de RNE: nome, filiação, ano de nascimento e locais de residência de 1938 em diante (afinal, a pessoa só iria se registrar em 1938 em diante!). Quanto ao nome é necessário saber que o nome de nascimento do país de origem pode estar traduzido, o sobrenome pode estar um pouco diferente, mulheres podem estar com o nome de casada e demais variações devem ser levadas em conta. Todo registro tinha um número, portanto caso você tenha o número do RNE, facilita muito a pesquisa.

Caso o imigrante tenha se registrado no estado de São Paulo (em especial nos arredores da capital), há fichas remissivas do RNE catalogadas erroneamente sob o nome de “cartões de imigração” no Family Search:

Ao pesquisar pelo nome de Elvira Perez Perianez, pudemos encontrar que o seu registro era o de número 32.426, feito em Santos-SP. Tendo essa informação, não é necessário informar o ano de nascimento.

Tendo esses dados, caso o imigrante tenha feito o prontuário no Sul ou Sudeste do país, a consulta deve ser feita no site de consulta a distância do Arquivo Nacional:

http://consulta.an.gov.br/

Após fazer o cadastro, clicamos na aba solicitação:

Colocamos na caixa em branco nosso pedido:

Em cima, em objetivo de pesquisa, pouco importa o que for colocado, pois é apenas para fins estatísticos. Caso o pedido seja para fins de cidadania, é aconselhável colocar Defesa de Direitos.

Acima da caixa branca, podemos escolher como queremos: apenas imagem digital ou uma cópia autenticada (que será enviada ao endereço de cadasto).

Após isso, só resta esperar. Você será notificado do avanço do seu pedido – quando começou a ser pesquisado, quando há algo a pagar, quando foi encontrado (ou não encontrado), etc.

COMO PESQUISAR RNE DO CENTRO-OESTE, NORTE E NORDESTE

Caso pesquisemos alguém que morou no Norte, Nordeste ou Centro-Oeste, o método de pesquisa é diferente. Primeiro, parte desses prontuários está digitalizada no SIAN!

Basta, primeiro, entrar no link acima e logar. Então passar o cursor sobre Fundos e Coleções e selecionar “Pesquisa Digital”.

Na nova página, em fundo, digitamos Fronteiras e várias opções aparecerão, então selecionamos a correspondente. Hoje, em 17 de outubro de 2023, quando atualizo esse post, há registro de Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Maranhão, Mato Grosso, Pará e Pernambuco.

Ao selecionar um fundo, em Termo procuramos por uma palavra chave, como um sobrenome ou nome. Tentemos com Rossi, sobrenome italiano, em Alagoas.

Aparecerão quatro prontuários, podemos acessá-los clicando no link em vermelho. O primeiro prontuário é de José Maria Monestier. Na pesquisa por Rossi ele aparece pois Rossi é um dos sobrenomes da mãe de José! Essa é uma vantagem: podemos procurar por palavra chave e em todo lugar que o OCR reconhecer esta palavra, aparecerá o processo.

Caso o imigrante que buscamos não esteja aí, a pesquisa deve ser solicitado na seção de Brasília do Arquivo Nacional. O e-mail de contato é consultasdf@an.gov.br, sendo que para solicitar a pesquisa, devemos enviar também o seguinte formulário preenchido:

COMO PESQUISAR OUTRAS PARTES DO RNE?

Para a pesquisa de fichas remissivas para todo o Brasil menos o estado de SP, deve-se pesquisar também no Arquivo Nacional, abrindo um pedido como se fosse para pesquisa de prontuário de estrangeiro. Para o estado de São Paulo, quando se quer pesquisar de São Paulo capital e arredores, pode ser feita a pesquisa pelo FamilySearch, como já explicado acima. o Arquivo Público do Estado de São Paulo também guarda as fichas remissivas das cidades das comarcas de Angatuba, Araraquara, Ariranha, Catanduva, Chavantes, Novo Horizonte, Novo Mundo, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, Santa Adélia, Sarapuí, Sorocaba e Tabapuã.

Para a pesquisa de livros de delegacia, a complicação é bem maior. O Arquivo Nacional guarda parte dos livros de delegacia do Paraná e Rio Grande do Sul, mas da maior parte do país esses livros tiveram fim desconhecido. Não foram geralmente recolhidos das delegacias, e o destino variou: em São João da Boa Vista-SP, foram microfilmados pelo Circolo Italiano e pode ser conferidos on-line. Em Taió-SC, foram mandados para um arquivo público municipal. Em grande parte das cidades, as delegacias sequer sabem que esses livros um dia existiram e há relatos de livros que foram simplesmente descartados. É aconselhável contatar a delegacia de polícia civil local e o arquivo público municipal para conferir se ainda existem esses livros.

Livro da delegacia de policia civil de Rebouças-PR, sob guarda do Arquivo Nacional

Quando queremos pesquisar a certidão de registro de estrangeiro ou a carteira de identidade de estrangeiro a complicação é ainda maior. Não existe segunda via desses documentos, e embora as vezes haja uma via no prontuário de estrangeiro, geralmente esses documentos foram parar com a família, ocasionalmente tendo parado numa habilitação de casamento.

Certidão de registro de estrangeiro de Anton Jubels, residente em Irati-PR, acervo de Ana Iubel

Publicado por ghpedroso

Genealogista, acadêmico de História e pesquisador da região de Campos Novos-SC, com foco em pessoas de etnia ucraniana e polonesa

26 comentários em “Pesquisas no Arquivo Nacional – Registro de estrangeiro

  1. Olá Gustavo, parabéns pelo material. Obrigado por compartilhar. Fiz uma solicitação de Prontuários ao Arquivo Nacional porém incluí vários familiares no mesmo pedido. Será que pode ser recusado por conta disso?

    Curtir

    1. Boa noite Leonardo. Recusado não vai ser, mas eu acho melhor fazer pedidos separados para agilizar. O meu primeiro pedido que fiz foi de três pessoas juntas 🙂

      Curtir

      1. Olá, excelente material, obrigada.
        Fiz a pesquisa no Arquivo Nacional e a resposta foi negativa. Não encontraram nada. O que fazer nesse caso?
        Vi que ym do seus ancestrais é de Irati. O meu tbm vivia lá na época. Onde localizou o registro do seu parente de Irati?
        Muito obrigada

        Curtir

      2. Boa tarde Juliana. Achei no Arquivo Nacional mesmo. Me parece que muita coisa foi perdida em Irati: eu tenho a certidão que meu trisavô fez de registro de estrangeiro em Irati mas não acharam, também não acharam de uma coisa. Talvez a delegacia de Irati tenha o livro de registros ainda.

        Curtir

      3. Meu descendente veio no Vapor Coblenz em 22.05.1905 para São Francisco do Sul. Fiquei sabendo que não existem registros de desembarque nem de embarque em Bremen. Para quem eu solicito uma via física desse prontuário de estrangeiro para usar como prova de imigração??? Obrigada!

        Curtir

      4. Oi, quanto a sua resposta: Boa noite Vanessa. Ao fazer o pedido, selecione Cópia Autenticada e peça que enviem ao seu endereço.

        Minha dúvida é onde eu solicito? É por e-mail? Qual? Obrigada e boa noite

        Curtir

Deixe um comentário

Crie um site como este com o WordPress.com
Comece agora