Uma segunda cópia dos registros religiosos – o Stato civile carloalbertino

No século XVIII, uma família com origem no que hoje é sudeste da França, os Sabóia, adquirem por meio do Tratado de Haia o Reino da Sardenha, que antes disto era parte do Império Espanhol.

Desde então, por cerca de 150 anos, os estados governados pela casa de Sabóia passam a ser chamados de Reino da Sardenha (ou Reino da Sardenha-Piemonte), embora fossem vários estados independentes (Ducado de Gênova, Condado de Asti, Principado do Piemonte, etc.).

Isso durou até o século XIX, quando os Savóia buscavam modernizar seu reino. Em 1847 fazem a fusione perfetta, que torna o Reino da Sardenha, oficialmente, um único estado. Esta medida foi tomara durante o reinado de Carlo Alberto di Savoia. No ano seguinte ele promulga o Statuto Albertino, uma espécie de proto-constituição do Reino da Sardenha (que mais tarde seria lei na Itália unificada).

Outra medida que exemplifica o caráter reformador de Carlo Alberto foi tomada em 1837: a criação do “registo civil” nos seus domínios. O termo registro civil está entre aspas porque na verdade era um proto registro civil, não era uma autoridade secular registrando nascimentos, casamentos e mortes, mas uma segunda via dos registros religiosos.

Neste magnífico artigo de Maria Marinelli e Sonja Moceri, podemos ver a íntegra do decreta que regula essa questão, a Regie Leggera de 20 de junho de 1837. Ela previa que os párocos e rabinos fizessem cópias dos livros de registro de batismo (no caso de judeus, nascimento), casamento e morte e enviassem à diocese e depois ao governo.

Por ter sido criado por um decreto do rei Carlo Alberto, esse proto registro civil é geralmente chamado de stato civile carloalbertino ou stato civile sabaudo (sabaudo é algo referente aos Sabóia). No entanto, vale lembrar que ele foi implantado em todos os domínios dos Savóia menos a Ilha da Sardenha, que tinha leis diferentes. Ou seja, nas regiões do Valle d’Aosta, Ligúria e Piemonte.

Nem sempre ele foi preservado e seus destinos são os mais diversos. Em alguns locais, ficou na diocese, como na diocese de Casale Monferrato. Em outros, como a cidade de Torino e Gênova, isto ficou no arquivo histórico municipal. Mas em alguns locais, isto foi ao arquivo de estado. Na tabela a seguir, listo o acervo de cada um dos arquivos de estado ligure-piemonteses relativos ao stato civile carloalbertino.

Tabela de Ligúria e Piemonte

Mais tarde, em 1860 e 61, o Reino da Sardenha incorpora outras regiões como o Marche e Emilia-Romagna e também implanta nelas esse registro – menos nas províncias emilianas de Modena, Parma, Piacenza e Reggio Emilia – que já tinham registro civil, como pode ser visto aqui. Na tabela a seguir, a disposição dos arquivos de estado da Emilia Romagna (excluíndo as já citadas províncias) e Marche com o seu acervo relativo ao stato civile carloalbertino.

Tabela de Emilia Romagna e Marche

Como pode ser visto, há uma abundância de registros na região de Marche mas poucos na Emilia-Romagna. Há vários registros da província de Bologna ainda sob a guarda do tribunale, disponíveis no FamilySearch e acessíveis neste link. Em outras regiões, como Forli-Cesena, ainda há registros sob guarda dos arquivos municipais, porém na maioria da Emilia estes registros não estão disponíveis – ao menos on-line.

Organização dos registros

Os registros seguiam um formato próprio, pré-preenchido. Os registros de batismo tinham a data e horade nascimento, batismo, local de batismo e nascimento, filiação e nome de padrinhos, profissão e domicílio de pais e padrinhos e quem apresentou a criança para o batismo, como pode ser visto no registro a seguir.

Cópia de registro de batismo

Já os registro de nascimento judaicos tinham formato similar, mas obviamente sem dados relativos à batismo e padrinhos.

Cópia de registro de nascimento judaico

Os registros de casamentos eram bem completos. Tinham nome dos noivos, profissão, filiação, idade, local de domicílio e nascimento (também havia o nome de testemunhas com idade e domicílio) – e até assinatura dos noivos, caso fossem alfabetizados.

Cópia de registro de casamento

O registro de óbito costumava ser relativamente gordo: o nome do falecido, de seu cônjuge, estado civil, idade, local de nascimento, data de óbito, profissão, domicílio, filiação e com que sacramentos faleceu (no caso de cristãos) além de dados biográficos do declarante.

Cópia de registro de óbito católico
Cópia de registro de óbito judaico

Na parte atualmente francesa dos domínios dos Sabóia, os registros seguiam o mesmo modelo, mas em francês, como pode ser visto nesse curioso assento a seguir.

Ponty-Etienne Bernard e Catherine Claire Curly eram ambos suíços imigrados ao Rio de Janeiro, onde casaram e tiveram filhos. Em certa altura, voltaram à Europa com dois filhos – entre eles, Jules Oscar, que nasceu no Rio em 28 de outubro de 1833. Mas a volta não foi para a Suíça, mas para a cidade francesa de Annecy (na fronteira com a Suíça), onde batizaram o filho Jules Oscar e sua irmã. Jules voltou ao Rio de Janeiro onde casou em 1862 com Luisa Ave Lallemant na freguesia de São José e morreu em 1914.

Publicado por ghpedroso

Genealogista, acadêmico de História e pesquisador da região de Campos Novos-SC, com foco em pessoas de etnia ucraniana e polonesa

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